A verdade sobre Foro e Laudêmio em Petrópolis: Entenda
Muito se fala sobre o pagamento de foros e laudêmios à Companhia Imobiliária de Petrópolis, empresa responsável pela cobrança dos dois valores, de propriedade de membros da família imperial brasileira. Para poder-se entender a razão da cobrança do foro (pago anualmente) e do laudêmio (pago toda vez em que um dito imóvel localizado em área foreira é vendido) é preciso conhecer e entender o instituto jurídico chamado “enfiteuse“, comum em diversos países do mundo, mas que há décadas está em desuso no Brasil, não podendo serem constituídas novas enfiteuses desde o fim do século XX.
Mas o que é a Enfiteuse?
A enfiteuse é instituto do Direito Civil (como o aluguel, o arrendamento, etc) e era o mais amplo de todos os direitos da propriedade. Basicamente é a permissão dada pelo proprietário de uma área ou imóvel – o senhorio – para que um terceiro – o enfiteuta – passe a ter o domínio direto (ou útil, dá no mesmo) daquele bem, podendo usar, gozar, possuir, alienar ou até transmitir por herança a um novo enfiteuta aquele mesmo bem. Contudo, pagando sempre um foro anual (que é como um aluguel, só que em valores muito mais módicos), e, sempre que passar o bem adiante, tem que pagar um laudêmio (usualmente 2,5% do valor de avaliação do imóvel). Assim, o senhorio, titular do domínio indireto, receberia, para sempre, inclusive através dos seus herdeiros, foro e laudêmio, como contrapartida de não ter efetivamente vendido seu imóvel. Não há uma relação tributária, mas apenas uma relação contratual, civil, entre senhorio e enfiteuta.
Em resumo, pra quem não é jurista, a enfiteuse acarreta uma espécie de aluguel bem baixinho, chamado foro, e uma obrigação de, a cada vez que o imóvel for vendido, pagar-se o laudêmio ao senhorio. Também existia uma obrigação de antes de vender, ofertar a propriedade ao senhorio, para que ele exerça seu direito de preferência.
A maior utilidade da enfiteuse é ajudar a ocupar terras inóspitas, lugares distantes, sem cultivo, quase que inexploradas. O senhorio escolhia lotear a terra e dá-la em enfiteuse, em vez de vendê-la. Em vez de tentar vender por anos uma gleba enorme de terra, por valores altíssimos, era melhor criar uma enfiteuse, pois isso ajudava a ocupar o espaço. Vender em pedaços pequenos uma terra tão distante, também era praticamente impossível. A idéia da enfiteuse era também dar finalidade a terras longínquas, que, além disso, com a ocupação por muitos enfiteutas, se valorizariam conforme o movimento em dada região aumentasse. Este serviço ela prestou, e ajudou muito a que a ocupação de terras no Brasil ocorresse de maneira ordeira.
A enfiteuse não tem nenhuma relação com Coroa, Monarquia, Príncipe ou coisa que o valha. A enfiteuse, o foro e o laudêmio são comuns a qualquer um que resolvesse estabelecê-la em alguma propriedade que lhe pertencesse.
A enfiteuse é um direito real, que podia ser constituído por qualquer pessoa, física ou jurídica, e até mesmo pelo governo. Foro e Laudêmio não são impostos, não são tributos, e não são taxas. Não existe “taxa do príncipe”, isso seria a mesma coisa que chamar aluguel de “imposto do proprietário”. O governo não tem absolutamente nada a ver com o que um particular recebe de laudêmio ou de foro anual, desde que este pague os impostos sobre seus recebimentos, como qualquer empresário ou trabalhador.
Por que esse príncipe ganha dinheiro às minhas custas?
Na verdade os membros da família real que recebem o foro e o laudêmio em partes de Petrópolis, recebem isso à custa deles próprios. Seus antepassados compraram uma fazenda, com dinheiro próprio, chamada “Fazenda Córrego Seco”. Dom Pedro I, então imperador do Brasil, tentou comprar uma fazenda chamada “Padre Correia”, mas seus herdeiros não concordaram em lhe vender a propriedade. Ele acabou comprando uma fazenda vizinha que estava à venda, justamente a do Córrego Seco, que na época pertencia ao Sargento-Mór José Vieira Afonso. Adquiriu a propriedade por vinte contos de réis, preço considerado muito alto para o valor real da fazenda: o dono deve ter visto que sua esposa, D. Amélia, queria muito a fazenda. A escritura de compra do imóvel pelo então imperador foi assinada em 1830. O monarca – que depois de ser imperador por aqui foi aclamado rei em Portugal – ainda comprou outras propriedades no entorno, no Alto da Serra, em Quitandinha e no Retiro, ampliando a área de sua fazenda.
O tempo passou. Dom Pedro II assumiu as rédeas da monarquia constitucional brasileira, e, em vez de parcelar a fazenda em pedacinhos e vendê-los, decidiu constituir enfiteuses. Expliquei acima o que elas são. Ele simplesmente pegou a terra que seu pai havia comprado, e decidiu não vendê-la, e sim usar a enfiteuse para que a cidade se desenvolvesse, e também, com isto, além de fundar um povoado, também fez um investimento, praticamente como o faz quem compra um apartamento para alugar.
No dia 16 de março de 1843, Pedro II, que estava com dezoito anos e recém-casado com a imperatriz Teresa Cristina, assinou o documento que arrendava (leia-se, constituiu a enfiteuse) as terras da fazenda do Córrego Seco ao Major Koeler para a fundação do que chamou de “Povoação-Palácio de Petrópolis”, em que estabelecia o início da cobrança do foro dos colonos moradores da região, entre outras coisas.
A enfiteuse gera muito menos dinheiro imediato que a venda. E bem menos dinheiro imediato que o aluguel. Mas ela tinha uma vantagem, a perenidade. Ou seja, é eterna. Apesar de gerar valores ínfimos de foro, gera os 2,5% de cada venda. E, com uma vantagem: ajuda a desenvolver a cidade, e mesmo a valorizar o entorno, conforme negócios vão ocorrendo.
Herdar um apartamento alugado, é, em menor escala, o mesmo que herdar uma enfiteuse.
Um detalhe curioso é que o Chefe da Casa Imperial, D. Luiz de Orleans e Bragança, e seus irmãos e herdeiros diretos, do dito “Ramo de Vassouras” da monarquia brasileira, não têm qualquer participação na questão dos foros e laudêmios. Esta parte da herança ficou para os membros da família imperial do chamado “Ramo de Petrópolis”, que comandam e administram a Companhia Imobiliária de Petrópolis.
Por que mesmo com a república eles continuaram com este direito?
Esta resposta é fácil. A família imperial perdeu tudo que tinha em função de ter a Coroa Brasileira. Só ficaram com aquilo que era deles, particular. Quer dizer, quase tudo. O Palácio Guanabara, por exemplo, era bem particular da Princesa Isabel, mas mesmo assim a república achou por bem tomar-lhe a propriedade do mesmo. Foi confiscado. A família imperial tentou recuperar a posse da edificação por 125 anos, no que foi um dos processos judiciais mais longos do país, até perder a ação em 2020, quando o Supremo Tribunal Federal decidiu que o palácio pertencia à União e não à família imperial, que nunca recebeu nada pelo prédio, que havia sido comprado por recursos próprios.
O direito continuou porque não tem nenhuma relação com a Coroa. Ele continuou porque a propriedade da Fazenda Córrego Seco – hoje parte de Petrópolis – era absolutamente e comprovadamente da família. É apenas um direito sobre uma propriedade privada, que pouco importa de quem é para ser válido.
Isso é parecido com aqueles prédios da Marinha?
Pera, pera. Sim e não, mas vamos primeiro corrigir uma coisa: não existe isso de prédio da Marinha, foro da Marinha, terreno da Marinha. A Marinha Brasileira não tem nada a ver com isso. São prédios DE marinha, foro DE marinha, terreno DE marinha. Assim, com letra minúscula mesmo. Terrenos de marinha são terrenos localizados no litoral. Terrenos que, segundo uma linha imaginária desenhada lá pelos idos do século XIX, ficavam na beira d’água e à época tinham uma importância estratégica e por isso teriam que pertencer, obrigatoriamente, ao governo brasileiro.
Nestas terras, o governo constituiu a enfiteuse, que já explicamos acima. E como é guloso, em vez de pagarmos 2,5% de laudêmio como fazemos em casos de terras de senhorios particulares, o governo federal abocanha 5%. Ah, e desde o início do governo Bolsonaro, se você esquecer de transferir o imóvel pro seu nome depois de registrar a escritura as multas são milionárias. Um único cliente, num imóvel que vale 2 milhões está pagando 500 mil reais só de multas anuais por não ter feito uma transferência.
E como se livrar disso?
No caso das enfiteuses particulares, o enfiteuta tem o direito de remir (ou seja, acabar) com o foro/laudêmio para sempre. Basta pagar pela remição do foro. Nas enfiteuses públicas que não são da União, a mesma coisa. Nas que são da União, ela é gulosa, e até pouco tempo não fazia a remição. Hoje, após uma ordem do então Ministro Paulo Guedes, pode ser feita. Mas… especialistas dizem que custa uma verdadeira fortuna. Melhor ficar pagando o foro e o laudêmio, dizem.
Quem mais tem esse direito além dos Orleans e Bragança de Petrópolis?
Muitas pessoas. Muitas famílias pelo Brasil têm este direito. Na verdade, como explicamos, qualquer um que em vez de vender suas terras ou alugar deu-as em enfiteuse, pode ter este direito. Também é muito comum que organismos da Igreja Católica Romana tenham enfiteuses, pois eram grandes proprietários de terras, e, para desenvolvê-las, criaram diversas enfiteuses. Exemplos de instituições que recebem enfiteuse são o Hospital dos Lázaros, o Convento de Santa Teresa, o Município do Rio, o Estado do Rio, etc.
E se tudo isso é tão simples por que dizem tanta asneira nos jornais e revistas?
Esta é a única resposta difícil de dar. Recentemente um deputado federal fanfarrão escreveu que pretende propor entregar as enfiteuses dos Orleans e Bragança aos moradores de Petrópolis. É o mesmo que dizer que a féria do Bar do Araújo, lá na esquina, vai passar a ser entregue todo mês aos moradores de rua da Tijuca. Ou que os aluguéis que a dona Zefa de Copacabana recebe agora vão para o orfanato das meninas pobres de Paty do Alferes. É apenas blá-blá-blá mal intencionado, falta de informação, ou conversa de político, mesmo.
Existe um projeto de acabar com os Foros e Laudêmios da União, leia-se, do Governo, leia-se, não ferem o direito de ninguém. É a PEC número 39/2011, da Câmara Federal. Uma repórter da Revista Money Times, que escreveu um artigo fantasioso e completamente estapafúrdio sobre o assunto, disse que este projeto planeja acabar com a enfiteuse das famílias. Não leu… Ocorre, mas não aqui. Falou mais uma montanha de impropriedades, imprecisões e bobagens, que mostram que sequer deu uma googlada num artigo jurídico. Ficou só no copia e cola de outro preguiçoso. Aliás, eu pensaria duas vezes antes de pegar as dicas de investimento da revista, depois de ler tanta bobagem num só artigo.
A Carta Capital publicou outro texto hilário, e muito interessante. Nele, afirma que a “taxa” (SIC) “não retorna em investimento público“. Pois é, nem o aluguel da Dona Zefa. Ela compra verduras, esmalte de unha e paga a prestação do carro do cunhado dela com o que recebe de aluguel do seu imóvel. Exatamente como quem recebe laudêmio e foro do imóvel da família que foi dado em enfiteuse em vez de ser alugado ou vendido, inclusive visando melhorar o povoamento de uma dita região.
O Correio Braziliense chamou o laudêmio e o foro de “imposto”. Infelizmente ninguém lembrou que só se paga imposto ao governo. Fez referência a uma divertida proposta do deputado Rogério Correia, do PT. Ele fez uma lei, que – mais do que mexer no instituto da enfiteuse – pretende mudar toda a característica do instituto “lei”. Ele fez uma proposta de lei só pra proibir a Companhia Imobiliária de Petrópolis de cobrar o que é seu de direito, por conta de tudo que foi explicado aqui. As outras famílias, empresas, governos, igrejas, essas aí…podem mandar Brasa! Cobrem mesmo! E a gente, que aprendeu na Faculdade de Direito que a lei era impessoal, genérica e igualitária, fica assim.. sorrindo de lado. O PL é o 553/2020, e equivale a uma sentença daquelas que os monarcas absolutos assinavam e esse pessoal tanto critica: bem direcionada a uma única pessoa, casuísta.
Tem também um projeto do deputado Jorge Bittar (PT). Neste, ele queria tirar o direito adquirido de todo mundo. Bem, pelo menos era de todo mundo. O projeto, porém, determinava que para que as pessoas perdessem seu direito para os enfiteutas, estes teriam que indenizá-los com 2%, mais todos os foros e laudêmios atrasados. Mais ou menos o que já é feito hoje. Mas… Vai ver ele não sabia. Também ocorre. Mais do que devia, porém.
A irritação de ler tanta bobagem passa também pelos monarquistas que não procuram se informar. Vi comentários que falam em “justa compensação à família imperial”. Não tem nada a ver. A família imperial tem o direito apenas porque era dona da fazenda Córrego Seco e a deu em enfiteuse. Se a dona da fazenda fosse a dona Zefa lá de Copa, ela estaria cobrando os mesmos valores em virtude do direito real que herdou. O direito é real e não Real (nada a ver com monarquia).
Enfim, mais um dia de “fake news”, bobagens, imprecisões e aventuras de gente que não sabe do que está falando. Tudo isso vai ficar arquivado no Google, para, quando houver um novo desabamento nas favelas e ruas de Petrópolis, desviar de novo o assunto do que realmente interessa. Petrópolis tem Prefeito e Câmara de Vereadores? Quem ganha com a total favelização da cidade? Os príncipes? Eles não cobram laudêmio nem foro nas favelas….
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(Gálatas 5:22-23)
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