Washington Olivetto: Como publicitário passou 53 dias sequestrado por grupo chileno

O publicitário Washington Olivetto tinha acabado de deixar sua agência, a W/Brasil, em São Paulo, e estava a caminho de casa em um Chevrolet Ômega blindado, conduzido por seu motorista. Por volta das 19h30, eles foram parados por homens usando coletes falsos da Polícia Federal, perto da Praça Marechal Cordeiro Farias, em Higienópolis. Sem reparar que era uma armadilha, o motorista desceu do carro a pedido dos supostos agentes e foi agredido com um soco. Logo em seguida, Olivetto foi tirado do seu carro e jogado no chão, antes de ser enfiado em um Peugeot e levado embora.

Naquela quinta-feira, dia 11 de dezembro de 2011, começava um longo pesadelo para um dos mais renomados publicitários do país, que morreu neste domingo, aos 73 anos. O fundador da W/Brasil ficou 53 dias num cubículo de três metros de comprimento por um metro de largura, forrado com isolantes térmico e acústico, sem janela ou outra entrada de luz. Proibido de sair, o empresário foi obrigado a fazer as necessidades em uma lata de lixo. Naquele período, Olivetto teve momentos de fúria causada pelo desespero e foi duramente agredido pelos bandidos chilenos que o sequestraram.

A porta do cubículo era aberta apenas na hora da entrega da comida. O corredor que dava acesso ao cativeiro também ficava vedado, para que o refém não visse a luz do dia com a porta aberta. O objetivo era fazê-lo perder noção do tempo. Para desorientá-lo, os sequestradores também deixavam um som ligado com música alta o tempo todo. Isso atrapalhava o seu sono e o impedia de ouvir as conversas dos criminosos no imóvel. Uma câmera de segurança monitorava todos os movimentos de Olivetto, que só podia se comunicar com os bandidos por meio de bilhetes escritos a mão.

Para manter a sanidade, o publicitário escrevia em relevo nas paredes revestidas com isolante plástico acolchoado. "Patrícia, meu amor, te adoro", escreveu ele, dirigindo-se à mulher.

Washington Olivetto — Foto: Bárbara Lopes/ Agência O Globo

O empresário foi salvo graças a um apagão de eletricidade. No dia 2 de fevereiro de 2002, a estudante de Medicina Aline Dotta, de 22 anos, estava deitada em sua casa, no bairro do Brooklyn, sem saber que era vizinha de um cativeiro, quando, por volta das 22h daquele sábado, ouviu batidas fortes na parede e pedidos de socorro. Imediatamente, pegou seu estetoscópio e o pôs na parede. Então, ficou sabendo que a pessoa que pedia ajuda na casa ao lado era o famoso publicitário. "Como não tinha luz, todas as TVs estavam desligadas, e, só por isso, pude ouvir as batidas e gritos", contou a estudante.

Aline e sua mãe acionaram a Polícia Militar e, em menos de dez minutos, dois soldados chegavam ao imóvel na Rua Kansas onde estava o refém. Àquela altura, os sequestradores haviam fugido. Quando os policiais abriram a porta do cubículo, encontraram Olivetto pálido, magro e com a barba por fazer. "Ele estava muito abatido, deve ter sofrido", disse o soldado. Assim que foi libertado, o publicitário ligou para sua mãe e sua mulher. Chegou em casa aos 30 minutos do dia 3 de fevereiro de 2002 e passou a noite em claro, falando com amigos e familiares sobre a experiência aterrorizante que vivera.

Grupo guerrilheiro chileno realizou sequestro

"A primeira vez que eles foram agressivos foi porque eu tentei sair na porrada", contou o empresário em uma entrevista coletiva para a imprensa, dias depois da libertação. "Aí, eu bati e apanhei. Depois teve um dia que eu berrei, espanquei, aí eles entraram em três e me algemaram, me amordaçaram. Fiquei quieto e eles tiraram a algema. Aí, você vai negociando, mas não dá pra ficar muito quieto, senão você fica louco, mas você vai pilotando. Mas, na verdade, eu tendo a ser sincero, que as reações agressivas deles sempre foram em momentos proporcionais à minha agressividade".

Washington Olivetto em imagens

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O publicitário Washington Olivetto morreu nesta segunda-feira. O publicitário estava com 73 anos— Foto: Ana Branco/Agência O Globo 2 de 18
O publicitário Washington Olivetto ao lado de sua esposa Patrícia Olivetto em seu apartamento, após passar 53 dias sequestrado — Foto: Odival Reis / Diário de São Paulo 18 fotos 3 de 18
Washington Olivetto Olivetto iniciou sua carreira em 1969, aos 18 anos, como redator— Foto: Marcello Nicolielo/ divulgação 4 de 18
Em 1978, Olivetto criou o personagem "Garoto Bombril", interpretado por Carlos Moreno — Foto: Divulgação 5 de 18
O comercial "O primeiro sutiã a gente nunca esquece", de 1987, foi criado para a marca Valisére — Foto: Reprodução 6 de 18
O publicitário convidou Leonel Brizola para ser o “pé esquerdo” do comercial da fabricante de calçados Vulcabras. Para o 'pé direito', Olivetto convidou Paulo Maluf — Foto: Divulgação 7 de 18
Cachorrinho da Cofap: propagando marcante no Brasil — Foto: Divulgação 8 de 18
Dono de campanhas que fazem parte do imaginário do brasileiro, Olivetto foi um dos precursores dos comerciais de oportunidade no país, ainda nos anos 1970 — Foto: Ana Branco / Agencia O Globo 9 de 18
Gilberto Gil e Washington Olivetto — Foto: Divulgação / Cristina Granato 10 de 18
Primeiro prêmio O Globo de propaganda. Sérgio de Paula e Marcos Silveira da Agência Doctor recebem o prêmio Grand Prix das mãos de Washington Olivetto — Foto: Carlos Ivan / Agência O Globo 11 de 18
Entrevista coletiva de Washington Olivetto após ser libertado do cativeiro em 7 de fevereiro de 2002 — Foto: Paulo Cesar Bravos 12 de 18
Washington Olivetto, Zélia Duncan e Bussunda — Foto: Divulgação / Cristina Granato 13 de 18
Washington Olivetto completou 73 anos no domingo. Ele nasceu em 29 de setembro de 1951 — Foto: Antonio Moura / Agência O Globo 14 de 18
Lançamento do livro 'A História de Mora', do jornalista Jorge Bastos Moreno na Livraria Cultura. Na foto, Moreno com o publicitário Washington Olivetto. — Foto: Michel Filho / Agência O Globo 15 de 18
O publicitário Washington Olivetto deixou o Brasil em 2017 e se mudou pra Londres — Foto: Barbara Lopes | Agencia O Globo 16 de 18
Washington Olivetto (publicitário) e Nirlando Beirão (jornalista) — Foto: Fábio Seixo / Agência O Globo 17 de 18
Washington Olivetto, publicitário, foi fundador de uma das agências mais premiadas de todos os tempos, a W/Brasil— Foto: Alexandre França / Agência O Globo 18 de 18
O publicitário Washington Olivetto foi diretor da agência DPZ e diretor de marketing do Sport Club Corinthians — Foto: Flavio Cannalonga / Agência O Globo Olivetto era um ícone da publicidade brasileira

No dia seguinte à libertação de Olivetto, a Secretaria de Segurança de São Paulo anunciou a prisão de seis sequestradores, todos eles chilenos. Eles tinham sido detidos em uma chácara no município de Serra Negra, no interior do estado. Entre eles, estava Mauricio Hernandez Norambuena, líder da Frente Patriótica Manuel Rodríguez (FPMR), um grupo guerrilheiro do Chile. Norambuena, então, ligou para os encarregados do cativeiro e avisou que estava preso. Em seguida, os comparsas dele abandonaram o imóvel no Brooklyn, deixando o refém sozinho. Percebendo isso, o publicitário gritou por socorro.

Sob o codinome de Comandante Ramiro, Norambuena participara de diferentes ações de insurgência no Chile, como um atentado fracassado contra o ditador Augusto Pinochet, em 1986. Ele havia sido preso em seu país, mas fugira de uma penitenciária usando um helicóptero.

Olivetto sabia dos riscos de ser vítima desse tipo de crime e tinha feito até uma apólice de seguro de vida e contra sequestro. Partiu da seguradora a decisão de contratar uma agência de gerenciamento de crises para cuidar das negociações com os criminosos, em vez da polícia. O primeiro contato com a quadrilha havia sido feito uma semana após o rapto, quando um entregador desavisado levou à casa do publicitário um buquê de flores com uma caixa e um bilhete. Na caixa, estava o relógio do refém, e o bilhete dizia que ele seria libertado tão logo as exigências para o resgate fossem cumpridas.

Na época, informações extraoficiais deram conta de que a quadrilha pedira US$ 10 milhões de resgate, mas o sequestro teve fim antes que o valor fosse pago. No cativeiro, os policiais acharam um caderno com anotações dos criminosos sobre o dia a dia no imóvel. Eles anotaram, por exemplo, que Olivetto chegou ao local pesando 80kg e, quatro dias antes da libertação, estava com 72kg. Os sequestradores também descreviam como era a alimentação e o estado de espírito do refém, além dos horários em que passava um carro de polícia diante da casa na Rua Kansas.

'Esta carta tem que me salvar', escreveu Olivetto

Também foram encontrados bilhetes que o publicitário entregava a seus carcereiros. Neles, Olivetto fez insistentes pedidos para negociar sua soltura diretamente com os criminosos, mostrando-se bastante desesperado para sair daquela situação: "Desculpem, mas tenho certeza de que existe alguma coisa que podemos fazer hoje, mais útil do que não fazermos nada pelo fim desse episódio. Continuo com o coração na boca. Por favor, mantenham a coisa de mandar bebida forte a cada entrada dos guardas. Tem me ajudado muito", escreveu o empresário em um pedaço de papel.

Noutra mensagem, o publicitário retoma: “Se a coisa não sair por aqui, a negociação vai se arrastar mesmo. Já fui explícito na minha proposta de assumir como minha a proposta de vocês”. Dias depois, Olivetto volta a tocar no assunto. “Insisto em ser ouvido hoje. Venham me ouvir e vamos resolver”.

Em carta repleta de erros, os sequestradores respondem. “Como a gente falo (sic), você tem que ficar calmo... Não adianta fazer insultos para nós... O senhor pede que acreditemos em você, mais (sic) você mesmo é responsável por todo esse lentidão... Você é uma pessoa muito inteligente, não entendemos como penso (sic) que seu sequestro era uma ninharia. Oje (sic) compreendo sua intranquilidade. Pedimos-lhe que entenda que as coisas têm seu ritmo, que têm que ser feitas com muita precaução. Nós não vamos danhar (sic) tudo por sua pressão ou por seu desespero".

Olivetto não se conforma. “Estou prestes a ter um infarto. Não quero morrer. Esta carta tem que me salvar”. Ao escrever para a mulher, diz: “Minha cabeça está perdendo o discernimento entre ficção realidade. Está tudo muito louco”. E completa: “Pata, te amo e te escrevo depois, se tiver alguma ideia. Te amo demais, minha paixão”.

A última anotação dos sequestradores no diário é às 8h58m de 2 de fevereiro. No mesmo dia, Olivetto, num bilhete, faz um apelo: “Aconteceu algo de bom hoje? Existe alguma coisa em que eu possa ajudar? Hoje, 2 de fevereiro é dia de Iemanjá, a rainha dos mares. Que Iemanjá abrace a todos e que nos leve a todos no rumo certo”. Horas depois, ele foi libertado.

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